Cenário Pandêmico: Como falar sobre morte com as crianças

 



O tema da morte traz, na maioria das vezes, uma atmosfera muito pesada, envolvendo sentimentos e pensamentos tenebrosos e confusos, motivo de medo e angústia ao mundo dos adultos e, comumente, é assunto evitado pelas pessoas, e, assim, ela permanece sendo tabu na nossa sociedade, que evita tocar no assunto, principalmente no seio familiar, especialmente com as crianças pequenas, até mesmo quando alguém da família morre. Porém, o cenário mundial da pandemia por COVID-19 tem apresentado diariamente o número expressivo de vítimas fatais e, inevitavelmente, a mesma trouxe o contato com a finitude da vida para uma relação mais próxima de todos nós, em nosso cotidiano.

As crianças têm perdido entes queridos e\ou presenciado a tristeza dos adultos diante de notícias de falecimentos de pessoas estimadas e, a criança, mesmo que ainda muito pequena, percebe, por sua sensibilidade, que há algo de errado e estranho acontecendo e, então, fica apreensiva, tentando entender o que está ocorrendo em sua volta. Por mais que seja um assunto desconfortável e doloroso para a esmagadora maioria dos pais, abordar sobre o tema se faz necessário.

A conversa sobre a morte e o apoio à criança no processo de luto. 

O momento ideal de aproximação com o tema deve ocorrer, preferencialmente, antes que alguém próximo faleça. Pois, aguardar a criança vivenciar uma perda, para ensinar a ela sobre finitude, é como agir só na crise. Os adultos ficam desconfortáveis, mas, é de grande importância que ela compreenda gradualmente sobre o ciclo vital.

 No início da primeira infância (período da vida que vai da gestação até os seis anos de idade) a criança, até os primeiros três anos, percebe o fim da vida unicamente como ausência. Entre os três e os cinco, a criança começa a assimilar a morte, mas ainda cerceada pela sua imaginação infantil. Assim como nos desenhos animados, em que os personagens caem de grandes alturas, são atropeladas, sofrem diversos acidentes e continuam vivos, as crianças podem fantasiar que quem faleceu poderá retornar também e que quem morreu está apenas viajando ou dormindo. A partir dos seis anos, fica então mais claro para ela que a morte é inevitável e irreversível, entretanto o processo até a compreensão plena é longo. A consciência da finitude da vida só ficará favoravelmente estabelecida a partir dos nove anos de idade. Diante disso é fundamental os pais expressarem sobre a irreversibilidade dos que já partiram, utilizando de termos compatíveis com a fase em que se encontram, bem como o seu limite de entendimento, sem deixa-las sem respostas ou com excessos de informações desnecessárias ao seu limite de poder de compreensão.

A importância dos rituais de despedida

Os rituais de despedida são importantes, pois possibilitam contato e dão significado à perda, além de abrirem espaço para o sofrimento e serem amparadas socialmente. Entretanto, com velórios proibidos, caixões lacrados e o número de pessoas restritas ao cortejo do enterro, novas formas de reinventar esse momento devem ser adotadas pelas famílias, como forma de vivenciar esse processo. Escrever cartas, realizar desenhos, anexar fotos e flores a barquinhos e soltá-los no mar, para quando chegar no horizonte e encostar no “ceu” ser recebida por quem partiu, pode ser um exemplo, bem como fazer orações, cantar músicas e soltar balões também podem ser uma das diversas formas de demonstrar carinho e respeito.

É relevante deixar claro que, se não é possível evitar as partidas, podemos amenizar a dor da saudade com a gratidão da oportunidade da vivência partilhada juntos. O mais importante, quando se aborda sobre a morte com as crianças, é deixá-las confortáveis para falar e demonstrar seus sentimentos, com a sensação de que, apesar da dor, estão sendo acolhidas, seguras. Apesar de sofrida, esta pode ser uma ótima oportunidade para se trabalhar e exercer a fé e a resiliência que existe em cada um de nós.


Marjorie Calumby Gomes de Almeida : Graduada em Pedagogia, Pós-Graduada em Psicopedagogia Clinica e Institucional, Psicanalista, Psicóloga Organizacional, Professora Universitária no Curso de Psicologia na UNIBRA.

 

 

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